Há algo de
profundamente assustador no modo ao mesmo tempo ansioso e otimista com que as
forças de oposição parecem saborear cada dificuldade que se apresenta para o
Governo Dilma Rousseff em seu esforço diário de sobrevivência.
É difícil
entender de onde vem tamanho entusiasmo. Se se tratasse simplesmente de se
contar com o possível apeamento de Dilma e do PT do poder, coisa que
efetivamente poderemos assistir nos próximos meses, vá lá. Afinal, que são mais
alguns meses de ansiedade e excitação para quem pode estar há mais de uma década
na fila? (alguns então remoendo suas frustrações e seu ressentimento por conta
da autêntica usurpação que julgam terem sofrido desde que – graças a seu
"maldito eleitorado" – esses petistas arrogantes ousaram assumir o
comando deste vasto e cada vez mais complicado engenho tropical).
Mas quais as
perspectivas que, acreditam eles, se abririam com a consecução de tal objetivo
básico, essencial e, aparentemente, autossuficiente? E o que imaginam pode
ocorrer ao longo dos meses em que não somente estará sendo decidido o destino
do atual mandato presidencial, mas também, sem nenhum exagero, o futuro mais e
menos imediato do país?
Imaginemos
que, de um jeito ou de outro, a comissão especial convocada para examinar a
proposta de impeachment dos doutos juristas se instalará e proferirá seu
veredito. Suponhamos que este último seja pela possibilidade de abertura do
dito processo por meio de uma decisão amplamente majoritária do plenário da Câmara
dos Deputados. E que tal votação se dê, talvez, na melhor (?!) das hipóteses, ainda
em janeiro. E que uma vez aprovado o afastamento provisório da presidente,
tenhamos pela frente ainda alguns outros meses até que o Senado profira a sua
sentença definitiva. Só a título de exemplo, entre a abertura dos trabalhos
para o julgamento político do presidente Fernando Collor, e sua deposição
definitiva, foi-se embora boa parte do segundo semestre de 1992.
Ora,
independentemente do possível – e, se chegarmos até esta etapa, praticamente
certo – desfecho, perdoem-me a cândida pergunta: em que país pensam que
estaremos vivendo? Como creem estará nossa sociedade e nossa economia?
E que apostas
fazem em torno dos possíveis novos governantes e sua nova coalizão? Quem serão
eles? Como governarão? Até quando?
Por outro
lado, que expectativas têm acerca de como se comportarão não só os membros do
atual governo, se efetivamente depostos, mas bem além deles, seu partido, seus
aliados e demais setores da nossa sociedade? Como creem reagirão estes que
mesmo insatisfeitos hoje com o comando da presidente em exercício se mostram
firmes na defesa de seu mandato, talvez não confiem muito nos prováveis
beneficiários de sua eventual deposição, nem apreciam as
perspectivas que se abrem com sua chegada ao poder, nem, muito menos ainda, os
métodos que vêm sendo utilizados para se produzir tal resultado?
E tentando
enxergar ainda um pouco mais longe: como esperam obter aquiescência para suas
eventuais vitórias eleitorais futuras, para o exercício de seus eventuais
futuros governos?
Há quem possa
imaginar ser possível uma deposição institucional e ao mesmo tempo cirúrgica e
indolor de um presidente eleito no Brasil. Quase nunca é.
Ou que basta a
mudança no leme do navio para se acertar as rotas da economia num novo equilíbrio
virtuoso.
Negativo. Mal
dá para o começo. E pode até complicar ainda mais o meio de campo (quem quiser
que retome a história errática do Governo Itamar Franco para lembrar quanto
tempo, quanta tentativa e erro foram precisos até se encontrar um rumo, com o
Plano Real; só não esqueçam também de recuperar e comparar o contexto político
da época e sua correlação de forças, com o momento atual; aqui cessam todas as
semelhanças – e qualquer otimismo pretensamente consistente).
Tanto para uma
quanto para outra solução, a política e a econômica, é preciso muito mais.
Principalmente num contexto político já radicalizado e polarizado, em que as
divisões partidárias assumem cada vez mais clara conotação social.
Pra começo de
conversa, é preciso legalidade, legitimidade, estabilidade, e um mínimo de
previsibilidade. Claro que há outros fatores importantes também, como alguma
competência, perseverança, coragem e sorte (por vezes, muita sorte). Mas o
problema mais grave com relação aos quatro primeiros requisitos é que, além de
demandar tempo, para eles não basta iniciativa e mérito individual. Ou eles são
produzidos coletivamente, pela interação contraditória, mas relativamente
controlada, de todas as diferentes e conflitantes vontades – e é para isso que
existem as famosas "instituições" – ou então,... babau.
Legalidade,
legitimidade, estabilidade e previsibilidade não são, portanto, meras palavras
bonitas. São pré-requisitos essenciais à vida social e à solução de seus muitos
problemas, e de cuja necessidade, infelizmente, muitos só se dão conta quando
efetivamente a perdem.
Certamente que
o governo atual também tem sua significativa parcela de responsabilidade neste
processo de erosão das aludidas pré-condições institucionais. Mas a tentativa
de sua inviabilização a qualquer custo, desde o momento de posse, inclusive, não
vem somente simplesmente paralisando-o e impedindo-o – de fato, se não ainda de
“Direito” –, de contribuir com qualquer tentativa eficiente de superação das
grandes dificuldades atuais. Pode igualmente estender a saída e a luz no fim
desse túnel para muito longe de nossas vistas.
E seria uma trágica ironia se por conta de eventuais
"pedaladas" mal dadas se produzisse uma tentativa afoita de concerto
de algumas bicicletas defeituosas, somente para colocá-las freneticamente no
rumo de uma autêntica corrida de obstáculos à beira do precipício.
Este comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirPrezado Fernando, o que é precipício hoje poderia ter sido evitado se a imprensa e os intelectuais tivessem tido a generosidade de apresentar ao cidadão o Foro de São Paulo. Não há políticos de oposição, o povo é a oposição. Diante de tantas revelações, despejadas assim de uma vez só, é natural que o povo queira se defender e a sua maneira de fazer isso é orgânica, é um processo vivo,sem os vícios da política formal e isso para mim é, por si só, a luz acesa no final do túnel.
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