Não faz assim tanto tempo e se comemorava, entre nós,
a vitória da esperança sobre o medo.
Hoje nada parece capaz de impedir, nas próximas
eleições, o trágico triunfo oposto: o do medo sobre a esperança (e também sobre
qualquer racionalidade política embasada na História desse país, e de algures,
ou em diagnóstico minimamente consistente sobre nossa realidade atual).
Não é para menos.
Aquilo que muitos ainda teimavam em conceber como desvio
mais ou menos circunscrito ou passageiro – ou seja: a violência constituinte de
nossa sociedade e o caráter rigorosamente hobbesiano do “Estado de Natureza”
espalhado e renitentemente reproduzido por tantas áreas de nosso território –
agora se apresenta cada vez mais desembaraçadamente como algo muito mais
profundamente enraizado, pervasivo e duradouro. E em tal contexto, não pode
mesmo surpreender o apelo de promessas drásticas e simplistas, como se os
problemas fossem fáceis de resolver, e algumas das soluções propostas para eles
não embutissem riscos e problemas ainda maiores.
Seria adequado, pois, qualificar esse tipo de anseio,
ou aflição, em busca de salvação imediata, e a qualquer preço, como esperança?
Afinal, quem entre nós, brasileiros, pode hoje se dar
ao luxo de cultivar qualquer otimismo digno desse nome? Quem pode estar seguro
de suas boas razões para escolher, consistentemente, uma das opções que se
apresentem como candidaturas ou plataformas, no sentido de nos tirar desse poço
de areia movediça em que fomos lançados? Quem pode sequer ter confiança de que
uma vez conhecido o veredicto das urnas, isso nos permitirá contar, a partir de
2019, com algo que possa ser chamado de governo efetivo, dotado de meios e
programas conseqüentes, e também capaz de se sobrepor a eventuais e previsíveis
tentativas de contestação de resultados eleitorais, sabotagens parlamentares,
judicialescas, ou midiáticas, ou, pura e simplesmente, novos e inusitados
golpes?
É claro que estamos diante dos efeitos sumamente
perversos – e cansativamente previstos e denunciados por muitos, com triste
antecedência – do processo de desestabilização política e institucional posto
sistematicamente em movimento no Brasil, com as conhecidas cumplicidades e
apoios mais ou menos conscientes, desde que se abriu a famosa caixa de Pandora
das novas cruzadas moralistas, há pouco mais de uma década.
Mas agora é tarde. A jovem princesa – também conhecida
como "democracia" – é morta (tudo bem; vamos dar uma chance aos otimistas
de plantão: digamos então que ela ainda não morreu; se encontra em coma, em
estado vegetativo, e respirando por aparelhos – resta saber quem controla esses
últimos....). E se confesso não enxergar saída fora das eleições, tampouco me
convenço de que mesmo na melhor das hipóteses – ou seja, a vitória da melhor
escolha possível – haveremos de ter condições institucionais de ver no futuro
imediato as presumíveis conseqüências positivas de um tal resultado.
De qualquer modo, nada parece ser capaz de deter o movimento
inegavelmente espasmódico e ressentido com que de um modo ou de outro, se
caracterizará um provável e significativo contingente de votos, impulsivamente condenado
a apostar em ofertas eleitorais mais ou menos imprevisíveis, radicais ou
temerárias (com duplo sentido, por favor). E isso numa demonstração muito menos
de qualquer expectativa positiva mais sólida ou palpável – com relação a esta
ou aquela escolha –, do que, muito mais, uma pura e simples manifestação inútil
de descrença raivosa, na ausência de qualquer perspectiva positiva.
Em suma: diante do triste espetáculo que nos foi
legado pelos aprendizes de feiticeiro do golpe, há grande chance de assistirmos
em outubro o momento triunfal do que poderíamos chamar de voto avestruz: diante
de um cenário tão desalentador, enterra tua cabeça no chão e vota.