Foram
exatos 64 anos desde o Maracanazo de 1950 até o massacre de ontem, no Mineirão.
Mais
de meio século de epopéia, drama, glória e ocaso do futebol pentacampeão
mundial (graças à eliminação precoce da tetracampeã Itália, ainda vamos poder
manter a exclusividade dessa marca por mais algum tempo; mas isso se torna cada
vez mais irrelevante).
Para
mim, porém, um ciclo histórico se fechou ontem: a era da supremacia inconteste
e neurótica do futebol brasileiro nas Copas do Mundo. A era de presunção e
ufanismo infalível dominada pela crença na nossa superioridade endêmica, na mística
insuperável da camisa amarela, na certeza de que somente algum fator extraordinário
e maléfico, extra ou intra campo - um complô internacional, um juiz ladrão, um técnico
muito burro, ou algum traidor da pátria travestido de frangueiro ou cobrador de
pênalti nas nuvens, etc. - poderia nos roubar, de fato, aquilo que por direito é
sempre nosso: o título mundial.
Acabou.
A
verdade é que o trauma de 1950 já deveria ter sido superado, com sobras, há muito
tempo, pelas cinco grandes conquistas subsequentes (a rigor, quem tinha de se
preocupar com aquela Copa são os uruguaios, que nunca mais conquistaram o título).
E pelo menos nas nossas três últimas vitórias, as que pude assistir, posso
dizer sem receio: em nenhuma delas a seleção brasileira era infalível ou imbatível
(como se isso pudesse existir em futebol). Até a mais brilhante e inesquecível
delas – a de 1970 – tinha uma defesa claudicante e só não tomou gol numa única
partida (a vitória épica sobre a Inglaterra, então campeã do mundo, por 1x0,
gol de placa de Jairzinho). As de 1994 e 2002, também tinham seus altos e
baixos, e também tiveram que passar por alguns sufocos. Mas eram todas equipes
taticamente consistentes, com recursos técnicos e, o mais importante, com a
cabeça no lugar. E mesmo assim todas poderiam ter ficado no meio do caminho,
encarando adversários de primeira, em jogos que foram muitas vezes difíceis (ou
escapando de outros rivais ainda mais temíveis, por conta dos cruzamentos da
Copa).
Não
vou repisar os problemas flagrantes da seleção nesta Copa (quem quiser que leia
os posts anteriores). A diferença mais importante entre o Brasil que começou
jogando ontem e o dos jogos anteriores – talvez, admita-se, especialmente mais
mal escalado do que de costume, em função da ausência de Neymar e de qualquer
plano B para suprir o que seria nosso único grande trunfo no torneio – é que,
dessa vez, esbarramos num time realmente forte, tecnicamente aparelhado e bem
preparado há anos para disputar essa ou qualquer outra competição de alto nível.
Para
quem não sabe, ou não se lembra (recomendo, aliás, a leitura dos meus poucos posts da
Copa de 2010, nesse mesmo blog) foi praticamente essa mesma Alemanha, com o
mesmo treinador, que há quatro anos despachou daquela Copa, em seqüência, e por
goleada, tanto a Inglaterra quanto a Argentina (de Messi, Tevez, Di Maria, e
com Maradona no banco), e só não chegou à final porque parou na própria
Espanha, nas semifinais. E mesmo assim os futuros campeões suaram para bater os
alemães (1x0).
Ou
seja: o placar de ontem foi mesmo chocante e duro de engolir. Mas a
superioridade alemã era mais do que previsível. O que obviamente não dava para
prever foi o modo com que essa diferença entre as duas equipes se traduziu em tantos
gols, em tão poucos e decisivos minutos. Apagões como esse que o time do Brasil
sofreu, porém, ocorrem no futebol com muito mais freqüência do que se imagina.
É que nem sempre isso acontece numa Copa, diante de um grupo tão competente como
o alemão – e que soube aproveitar muito bem a oportunidade; coisa que a maioria
dos times não consegue –, e acometendo, do outro lado, uma seleção tão
experiente como a nossa deveria se mostrar.
Certamente
é impossível deixar de creditar muito dessa pane ao estado emocional lamentável
em que foi colocado – ou se colocou – esse grupo.
Mas
deixemos isso para lá. Pois não tenho nenhum interesse em procurar causas
unilaterais, nem muito menos participar do infeliz esporte nacional de busca de
culpados (inclusive porque, como já sugeri, o problema é maior e tem a ver com
a queda geral de qualidade do nosso futebol).
Muito
mais importante, creio, é tentar aprender com os vitoriosos da hora. E aí temos
material de sobra, principalmente em termos de planejamento de médio e longo
prazo, mas também de como lidar com a pressão psicológica e com as muitas interferências
que nada tem a ver com o esporte, mas que são inevitáveis (como as da política
e do mercado).
Mas
para começo de conversa, aproveitemos enfim essa dura lição que os alemães nos
deram, deixemos de lado o peso do passado, e encerremos de uma vez o ciclo
iniciado em 1950.
Sepultemos de vez essa empáfia presunçosa. E de
quebra também o complexo de vira-latas que é seu duplo inseparável.
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