Análise de pesquisas de opinião é sempre um
negócio arriscado. Ainda mais quando você não tem acesso a muitos dados, não
pode desmembrar os índices agregados, nem pode sair a campo para testar
hipóteses ou mesmo meras possibilidades de hipóteses.
Mas olhando a evolução dos números sobre avaliação
do "governo"Temer, ao longo desse seu
tenebroso primeiro ano, não deixa de ser sugestivo o modo como eles
parecem delinear uma tendência constante e ininterrupta de aumento da
desaprovação.
À princípio, não poderia surpreender a ninguém em
seu juízo perfeito que a dita "administração" atual tenha conseguido
bater os recordes de avaliação negativa que até hoje eram galhardamente
sustentados pelo há muito finado Governo Sarney (1985-1990), em seus
deprimentes estertores (mais exatamente no ano de 1989, não por acaso o da
eleição do ex-caçador de marajás, Fernando Collor de Mello – candidato, então,
ao papel recorrente de salvador da pátria amada, salve, salve!). Com efeito,
não pode ser minimizado o fato de que desde pouco meses após usurpada a
presidência da República por Temer e chegando até a última pesquisa encomendada
ao Ibope pela CNI ( https://g1.globo.com/politica/noticia/governo-temer-e-aprovado-por-3-e-reprovado-por-77-diz-ibope.ghtml
), os inicialmente razoáveis índices de
aprovação e confiança no "governo" seguiram sistematicamente
despencando, aferição após aferição.
Mas como então interpretar tal fato levando-se em
conta, porém, que não foram poucos os apoiadores da chegada dessa coalizão ao
Poder – como ainda hoje existem muitos que, de um modo ou de outro a sustentam
ou justificam (em geral, com argumentos tão convincentes e inspiradores quanto
uma poesia de sua Excelência presidencial) –, assim como segue intacta e cada
vez mais autônoma a agenda de mudanças que unificou o poderoso movimento
golpista (a despeito de rusgas e rivalidades que acometem seus partidários,
além, é claro, das diferentes apostas que vão fazendo em torno das eleições de
2018 – incluída aí, também, obviamente, a possibilidade de se impedir as
próprias eleições, promovendo-se então outro golpe dentro do golpe)?
Uma historinha que pode dar conta dessas
contradições é simples (mas espero que não faça nenhum boi dormir): a talvez
não tão impressionante e constante deterioração da popularidade do
"governo" Temer parece espelhar fielmente a reação e o desapontamento
de relativa maioria do eleitorado brasileiro diante da promessa fajuta –
alimentada ad nauseam pelos golpistas, suas claques midiáticas, et
caterva de intelectualóides disponíveis - de que uma vez extirpada a praga
petista do Poder, e sobrevindo a isso uma nova coalizão partidária devidamente
sólida em torno do novo capataz e seu competentíssimo e abnegado projeto de
salvação nacional, todos os problemas econômicos do País se resolveriam
automaticamente, e, por último, mas não menos importante, toda a desenfreada e
desnuda corrupção seria castigada e suprimida (porque, afinal, qualquer criança
brasileira "bem informada" sabe que a malversação de recursos
públicos em Pindorama é não somente uma invenção do PT, como exclusividade de
seus governos!).
Assim, bastou por um lado que o bolso da maioria
dos cidadãos não apresentasse os devidos e esperados sinais de redenção. E nem
mesmo as alvissareiras novas de redução da inflação e de queda dos juros
parecem ter surtido, por enquanto, grandes impactos (já que vá lá explicar a um
desses bem alimentados dândis televisivos da economia engravatada que para o
comum dos mortais sem crédito e acesso ao sistema financeiro a redução da taxa
de juros não chega a entusiasmar, ou que a redução da inflação pode não fazer
tanta diferença assim, dependendo dos itens que compõem a média ou do patamar
inicial dos preços que, eventualmente, param de subir ou mesmo descem; ainda
mais, é óbvio, se você não tem nem salário digno nem rede de proteção social
que lhe permitam consumir...).
Quanto ao fim da corrupção... bem. Alguém já
disse, e outros repetiram, ao longo dos últimos quinhentos anos - ou seriam
mil, dois mil? - que neste assunto o dito cujo fica um pouco mais embaixo.
Que o digam sua Excelência, sua qualificadíssima entourage,
suas bases pra-lamentares, e os implacáveis defensores da moral pública e
palmatórias da humanidade, na mídia, no Ministério Público, no Poder
Judiciário. Graças à ação patriótica e perfeitamente harmônica de todos, o
cidadão brasileiro cada dia sabe melhor o quão pode dormir descansado com
relação a seus direitos fundamentais e ao destino seguro e eficaz do imposto
que com tanto suor e alegria destinou aos encargos da "gerência".
Junte-se afinal, a tal enredo edificante que nos
vem sendo legado há coisa de um ano pelos novos líderes da República, o
conjunto portentoso de medidas e reformas que eles vêm promovendo com tanta
presteza e espírito público, para o bem de todos e felicidade geral, e ainda
caberia, mais uma vez, perguntar: é possível ter alguma dúvida dos porquês de
tais índices de aprovação e confiança?
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